sábado, 26 de janeiro de 2008



















nos restos da cidade
desabitada que foi pelas parcelas de rio
e charcos da tempestade,
apenas na luz distante os barcos flutuam

encontro na noite o interior
das vozes que se calam ao meio-dia claro

na noite de lisboa as paredes tremem,
ainda que sejam cobertas de portas e de vidros
quando o sangue inesperado me corre pelo rosto

ninguém me falou na transparência dos vidros
e o cimento é demasiado opaco para que
os sinais se transformem nas ruas empedradas
onde as almas são intocáveis
e as raízes vão manietando
o meu corpo aberto sobre um sonho
onde passa um jardim

de costas para o estuário
escolho as palavras que gritam a cidade
e no mesmo movimento deixo que a água
me amoleça e trespasse
e a luz intermitente me adormeça o cansaço

só a ilusão de uma sombra cinzenta
resiste ao mar que me levou e me trouxe
morre de saudade este mar
incutiram-lha os de torna-viagem,
nada já reside nos outros, só em mim paira
o desmaio num sorriso acorrentado
aos olhos, procurando o novo mundo
como se fosse possível navegar ainda mais

in Com a Cidade no Corpo (edição da CML)