Representando esta vertente socialmente empenhada, temos ainda António Ferra, com vários livros publicados para teatro. Os seus textos, aliando fantasia e realidade, revelam preocupações sociais evidentes, quer pelo recurso a figuras-tipo (caso da peça que obteve o 2.° prémio de Teatro Infantil da SEC, em 1980, Caleidoscópio, com personagens como «o operário», «o camponês» ou «Maria, a mulher» ) quer através de personagens-animais e do seu discurso, como acontece, por exemplo, em Histórias e Teatrada... (1995) onde, a certa altura, três rãs comentam como os homens gastaram a água do lago e os males daí resultantes. Em Zé Mandão... (1978) temos uma crítica à sociedade industrializada que se preocupa apenas com o lucro, e uma reflexão sobre uma realidade que nem sempre corresponde a um sonho «cor-de-rosa», e que é sobretudo no esforço conjunto e na cooperação que se pode construir um mundo melhor: «Belinda: Já comecei a aprender / que a vida não são só rosas, / o céu, a montanha, o ribeiro/ quand'há gente que faz tudo/ pr'a conseguir mais dinheiro.»(P. 21) Neste texto ainda, a figura do Clown-Corremundo (novamente o palhaço como um importante elemento mediador do conhecimento) surge como aquele que tem uma perspectiva diferente sobre as coisas, mormente sobre as máquinas que roubam o «ganha-pão», ensinando os habitantes da vila a tirarem partido da máquina, que deixa de ser pertença de um para ser de todos (promoção do espírito cooperativista).
Ed. Caminho, 2006